Carraspana

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Meu poeta tende a ser tão poeta, que é capaz de escrever poesia no muro de uma rua com cascalho de tijolo, eu acho. Este meu poeta inunda meu quarto de lágrimas e meu existir, encharca, de palavras. Tem o dom de embriagar-se de vida, e apartar todas as aspas que possa haver, já que de aspas bastam seus próprios caminhos, tão improváveis. Este meu trovador, não vislumbra um mundo melhor, torna-o mais bem quisto: para mim, pelo menos. Aos seus olhos não faz nada mais que poesia, ao meu, por outro lado, viaja entorno da Terra tendo como missão gozar da mais perfeita simetria dos mundos e refletir toda maestria que existe na poeira, na velha e suja poeira. Para ele são só linhas, para mim são copos a serem preenchidos, de formas tão exatas, mais tão exatas que superariam até os cálculos mais perfeitos de preenchimento de volume que poderia ter. Nossas conjunções são tão distintas que enquanto ele vem com o “mas”, apareço eu com o “e”, só para extrair uma vermelhidão de seu vulto. Não retiro sequer uma frase dele, uma palavra, uma embriaguez. Talvez seja disso que o mundo precise. Pessoas bêbadas, poetas, translúcidas. Amáveis ou amantes. Que vomite! Saia fígado, rins, trompas. Saia poesia. Não se ganha sem se perder. E ele se perde. Adoro quando se perde. O que fica para sempre são suas recordações, suas memórias, suas palavras. E este meu poeta, sabe muito bem como assim fazê-lo. Não guarda somente seus feitos na memória de quem o lê; armazena seus delírios na alma de uma folha de papel de pão, que mesmo amassada, rasgada, cortada, para sempre terá a consoante. Terá, ele. Será ele. Este meu poeta. Cuja embriaguez o torna sóbrio, tão sóbrio que busca a mão de sua amada a todo o instante, para que se faça eterno o que se esvai em poucos minutos: sua caneta.

Seria ele naturalmente poeta, ou sua incrível, pressuposta natureza, o tornou bêbado demais de poesia?

Mariana Cassiano, escritora de segunda.